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Artur de Sousa Pinga

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Mensagem por joao castro Seg Jul 26, 2010 2:41 pm

Artur de Sousa Pinga
Artur de Sousa Pinga Pinga


Natural do Funchal — 30 de Julho de 1909 a 12 de Julho de 1963




Quando Miguel Siska assumiu o comando da equipa técnica do F. C. Porto, em finais dos anos 20, não escondeu as ambições: queria, como treinador, ganhar pelo menos tudo aquilo que ganhara como jogador. Viera da Hungria para o Porto. Com um contrato secreto. Em Budapeste era mecânico dentista, no Porto fizeram dele... mecânico de uma empresa de vinho do Porto. Só para português ver.
Foi Siska quem moveu esforços no sentido de trazer Josef Szabo do Funchal para a cidade e para o clube a que já se devotara. Com Szabo veio um jogador que espalhara o perfume do seu futebol pela Madeira. Tinha como apodo... Pinga. Que era coisa que já lhe vinha do pai. Chegou, abrupta e timidamente, ao Porto a dois dias do Natal de 1930. Não demoraria muito a revelar os seus atributos: fazia o que queria da bola, como verdadeiro virtuose do esférico, hábil em fintas e malandrices para ilaquear defesas, chutador portentíssimo. Era um diamante ainda por lapidar. Szabo falou do seu génio com tal paixão que os dirigentes do F. C. Porto até ousaram entrar por caminhos espúrios para garantir mais cedo a sua ligação ao clube. Para má sorte do Marítimo.
A propósito disso haveria de escrever-se numa das primeiras edições de 1930 da revista Stadium: «Sousa deixou de jogar no Marítimo para ficar no Porto. E vale dizer aqui que foi necessário fazerem-se umas falsificaçõezinhas, umas tratantadazitas para ele começar desde logo a exercer a sua acção de esplêndido jogador. Uma troca de retratos... umas malandrices na Associação... E aquela carta lavrada no livro da Associação em que, constatando-se que Pinga estava preso pelo Funchal, lhe era vedado jogar no Porto mas, por interferência de alguém que apareceu um dia, depois foi dada como não existindo pelos mesmos directores que, transigindo, lapisaram-na e Pinga já jogou? Oh! A Associação de Futebol do Porto é fértil em mistérios»...
Pinga passou a receber 500 escudos por mês, pagos, secretamente, por baixo da mesa. Para manter as aparências deveria fingir que trabalhava na fábrica de Sebastião Ferreira Mendes, que não muito depois chegaria a presidente do F. C. Porto. Foi esse dinheiro grande que venceu o único empeço que trazia no peito: as saudades da mãe, que ficara no Funchal. E, fulgurantemente, tornou-se a estrela da companhia, ofuscando mesmo Valdemar Mota — que algum tempo antes contracenara com Beatriz Costa num dos primeiros filmes produzidos em Portugal e que era mais que um ex-líbris do F. C. Porto por ter sido o seu único jogador a disputar os Jogos Olímpicos de Amesterdão. Sem espanto, estreou-se na Selecção Nacional, no Ameal, em 1930. Contra a Espanha. Com uma derrota (0-1). Mas os espanhóis ficaram embasbacados com aquele português tão novinho e com tanto talento. Da Selecção só sairia em 1942. Contra a Suíça. Já como capitão de equipa. E no Porto foi ganhando tudo o que havia para ganhar na região e algo mais no País...
Em 1946, regressou Szabo ao F. C. Porto. Aceitou receber 1500 escudos por mês para recolocar o clube no trilho da vitória. Na esperança de que fosse o milagreiro que sebastianicamente se esperava. Pinga era já estrela em ocaso... Em Outubro de 1945 tivera de sujeitar-se a uma então complicadíssima operação ao menisco, sendo dos primeiros (senão o primeiro...) futebolistas portugueses a fazê-la, colocando, a caminho da banca do cirurgião, a possibilidade de não mais voltar a jogar futebol. E já com saudades do futuro lamentou que o futebol estivesse a perder o encanto do malabarismo que fora sempre o seu trunfo principal, considerando que havia internacionais que mal sabiam dar um pontapé numa bola. Mas o mito criara-se e desenvolvera-se. Nostalgicamente, portistas que ainda rezavam pelo seu regresso defendiam que o futuro estádio do F. C. Porto deveria chamar-se Artur de Sousa (Pinga).
Com 36 anos, ainda voltaria a jogar. Não por muito tempo. Pouco depois era o adeus, em definitivo, de um dos três Diabos do meio-dia, apodo que ficara do tempo em que o F. C. Porto, jogando contra o First de Viena, então considerada a equipa-maravilha da Europa, à hora do almoço, por conveniências (?!) de organização, Pinga, Valdemar e Acácio Mesquita maravilharam o público, destroçando o adversário austríaco, ganhando-lhe. Diabólicos aqueles três internacionais do F. C. Porto. A bola brincava entre os três de campo a campo. Por isso Rodrigues Teles lhes chamou assim — os três Diabos do meio-dia. Sobre isso e sobre a maravilhosa tríade diria Pinga, na véspera da sua despedida como jogador de futebol: «Nós os três... Aquilo é que era jogar... Que desculpem a vaidade, mas parece--me que nunca mais se arranjam três rapazes da bola tão intimamente ligados a acertar na borracha. Se até nós, às vezes, nem sabíamos como aquilo era...»



Saudades



Em 1933, perdido o título de campeões de Portugal, os dirigentes do F. C. Porto decidiram remoçar a equipa, pescando no Boavista. Para isso ofereceram 800 escudos por mês a Carlos Pereira, Castro e Vasco. Pinga sentiu-se injustiçado. Mas o seu orgulho próprio fê-lo sofrer em silêncio. Se ao menos lhe pagassem 1000 escudos por mês! Mas o que mais o revoltou foi nem sequer terem tido uma palavra para com ele. Ressentido, fez as malas, comprou bilhete para Lisboa, para regressar, secretamente, à Madeira — ou, se calhar, tentar aventura no Brasil. Ninguém soube bem porquê, dirigentes do F. C. Porto aperceberam-se da debandada.
De escantilhão, correram para a estação de São Bento. Pinga disse-lhes que eram as saudades da mãe e da ilha apertando de novo... Eles retorquiram que passariam a pagar-lhe 800 escudos por mês. Pinga rasgou o bilhete. Os outros sorriram... E para evitar outros eventuais transtornos o ordenado foi-lhe sendo aumentado todos os anos. Substancialmente.



Com Pinga de vergonha



Em 1937, Pinga era, naturalmente, o jogador mais bem pago do F. C. Porto. Ganhava 1500 escudos por mês. No Sporting, Peyroteo cobrava pela metade. Os ordenados de todos os jogadores portistas rondavam, anualmente, os 166 contos. Nesse ano o F. C. Porto voltou a ganhar o Campeonato de Portugal, num jogo em Coimbra, que foi como que uma vingança pela fuga de... Szabo, então treinador leonino. No ano seguinte, depois de vencerem o Benfica, na Constituição, por 4-2, os portistas perderam, nas Amoreiras, com os benfiquistas de Ribeiro dos Reis por... 0-7. A Direcção do F. C. Porto, sentindo-se humilhada, decidiu fazer de três jogadores bodes expiatórios. Um deles era Pinga, acusado precisamente de não ter suado a camisola que vestia. Ele que era incapaz de fazê-lo, ele que jogava sempre com o coração acima do génio!
Na cidade gerou-se uma onda tal de solidariedade que... Carlos Costa, presidente portista, teve de dar o dito por não dito, amansando, assim, o seu instinto quixotesco de justiça. Afinal aquilo não fora mais que o último reflexo do F. C. Porto a resvalar para o abismo, com um défice que já ultrapassava os 200 contos, telefones cortados, balneários sem água. Para Pinga foram dias terríveis. Escondeu-se na sua casa da Boa Hora, evitando até aqueles banhos de multidão que ele adorava, sobretudo entre as meninas da terra, que o consideravam o mais simpático e galante jogador do Mundo. É que Pinga tinha tanto de génio como de sentimental — e uma beliscadura na sua honra era, para si, pior que uma punhalada nas costas. E ele sabia que aquela suspensão era ainda mais do que isso. Mas passou depressa e o presidente acabou mesmo por se imolar no fogo que ateara. E Pinga continuou a ser Pinga...



As lágrimas em Pinga



A 7 de Julho de 1946 a festa de despedida de Pinga. Chorou-se de emoção quando ele, lágrimas nos olhos, verdadeiramente sucumbido em presença da manifestação que lhe fora prestada, abandonou o Estádio do Lima. Ninguém resistiu. Estrugiram as palmas. Pinga sem conseguir falar para agradecer, sem forças para se retirar do campo — e o público de pé, galvanizado, acenando-lhe com lenços, gritando o seu nome, embora muitas das gargantas estivessem abafadas por soluços. Nunca o Porto vivera momentos assim — e nunca mais viveria... A saudade tudo abafava. E quando Pinga deixou o relvado o jogo entre o F. C. Porto e a Selecção Nacional perdeu todo o sentido...
Logo após a despedida, Pinga tornou-se treinador do Tirsense — não foi preciso esperar muito para viver um momento de glória como os que vivera como jogador, ao eliminar o Sporting dos violinos da Taça de Portugal. Foi tal o choque entre os lisboetas que protestaram o jogo com o peregrino argumento de que o campo era a... descer!!!
Por essa altura ainda Cândido de Oliveira tinha dúvidas sobre quem fora o maior jogador português de todos os tempos: se Pinga, se Artur José Pereira, o ás dos anos 20. De Pinga escreveu num estudo publicado em A BOLA em Abril de 1945: «Artur de Sousa foi um jogador fulgurantíssimo — verdadeiramente genial. Talvez o maior talento de jogador do nosso futebol. Tudo nele era prodigioso: a concepção, como a execução; a imaginação viva e riquíssima marcada na escolha do lance ou do toque subtil, ou a finta intencional e preconcebida, ou no pormenor em que revelava a sua grande inteligência prática, o profundo e exacto conhecimento do jogo e dos jogadores e até sentido artístico — de verdadeiro artista do futebol.»
O fascínio manteve-se pelo tempo. Por isso, quando foi convidado para treinador do F. C. Porto, Cândido fez questão de ter como seu adjunto Pinga. Pinga regressou para não mais deixar o clube que lhe conquistara o coração. Quando Cândido partiu tomou conta das classes mais jovens. Foi fazendo obra. Ensinando o seu génio. Mas estava já minado pela doença. Morreria em 1963, vítima de cirrose — porque o vinho, se pode ser o néctar dos deuses também pode ser a perdição dos génios. Como Pinga.




Artur de Sousa Pinga EquipadoPinga

FCP 1938/39 League Champions



PS: Obrigado ao Nuno pela ajuda na pesquisa. Wink

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Mensagem por Peplin Seg Jul 26, 2010 8:49 pm

Pinga Prayer

Amanhã, coloco um pequeno texto sobre ele.
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Mensagem por Nuno90 Seg Jul 26, 2010 8:53 pm

Este Sr. dá apelido à minha família cá na terrinha Mr. Green
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